sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Agonia

Este verso que salta da garganta
e escorre em mágoas pela tinta da caneta,
é a história corrente, chorada
vista nas enxurradas dos becos
e bocas sofridas,
desesperada.

É o mesmo
do órfão que chora
num canto esquecido da cama
do abrigo que não completa o sonho
nem livra a carne
da memória do abandono.

É a mulher que não sabe
ser senão traída.
E ama solitária a sumir na cabeceira
e enxugar no lençol
a lágrima desmerecida.

É aquele,
o sapo engolido
por quem não concorda mas tem chefe.

É a voz que quer gritar,
mas cala.
É a vez que já não importa.
É o trem
que já não vai pegar.

Para senti-la, é preciso,
sentir que não vale a pena
e desistir.
É a vida que já não deseja.

Para escrevê-la é preciso um ato
de desespero máximo, último.
Ir às ruas em horário de pico
sem explicar um tiro;
suicídio.

Para dizê-lo:
Esta vida já está morta!
Morrer dela é tentar sobrevida.

São todos os sentimentos
em retalho único que gira em tormenta.
Do qual nada se entende,
mas tudo assenta.

Meu ardor

Desculpe se insisto em versos
com intuitos secretos
e lágrimas nas mãos.

Se me derreto e pingo
sem um pingo de vergonha
é Para dizer-lhe:
“-Não concebo viver sem paixão!”
E mesmo louco ou mentiroso
prefiro o ar e a dor
pulsantes
no peito.

Por que se para viver ditado
é que se torne silente um coração,
revolto-me em choro
e lacrimejo a dor do abafo.

Então, se me atiro em poço
sem pensar aonde é o fundo;
se entrego tudo e me estrepo
vou à lona, bebo a lama no chão;
se não tenho carreira
ou futuro promissor,
É argumento
Mais valer o que sinto
sem razão.

Em meu tempo
de presente,
busco o coração.

Em espera a poesia ronca em súplica
alguém que espante a solidão,
alguém que viva por paixão!

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Cativeiro

Por achar em todas as coisas mínimas o passo da maior grandeza eu me ferrei...
Querendo ver qualquer merda de qualquer humanidadezinha cultivada num apartamento.
Cercado por coisas que não são minhas mas, coisas que me detêm. Nada além de um prisioneiro.
Se possível encher a cara de ódio e vodca, para passar pelos outros idiotas sem ser notado.
Fedendo a sexo antigo, fedendo a suor de uma maratona que não percorri.
Uma batalha de outrora me faz ainda pensar que estou vivo.
É só nostalgia daquilo que não vivi.
É saudade das coisas que não virei a conhecer, mas que, caso tenha a oportunidade, explodirei sem pestanejar.
Queria voltar a rever aquelas montanhas, a única coisa real da minha vida. Aquela muralha que me aprisionava, também me tornava mais casto, mais puro, menos falso comigo. Porém hoje, quando vou até elas, elas se recusam em vir até mim. Não é uma questão de escolha. É uma questão de irreversibilidade.
Os olhos mudam com o tempo, o corpo muda com o tempo, o tempo muda com o tempo.
O tempo é o grande inquisidor das nossas vidas, e qualquer sentido que não se submeta as suas questões perece inevitavelmente. Burlar-lo é impossível, aceitá-lo ainda menos.
Como se por uma conspiração interna, vi que estou fechado, trancafiado no mundo e não consigo retomar a liberdade que está dentro do eu... eu já não existe... eu já era!
Então o que resta?
Acho que encontrar aquele resto de dignidade que guardei no fundo da gaveta do lado daquele revólver. E então carregá-lo com dignidade e disparar!
Contra mim? Contra alguém? Contra todos?
Não importa! Nunca será contra mim, nunca contra todos. Porém, toda vez que disparar contra mim atingirei alguém que cativei. O que, na verdade, não faz a menor diferença.
Já é tempo de libertar os cativos.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Quem somos?

Preocupado em fazer as coisas;
Esquecido de ser os homens;
Confinado nas paredes cinza;
Acabado pra entender que somos,
Fulgazes vítimas das fomes;
Violentados pelas autoridades;
De quem não tem sonhos,
Pra outorgar vontades;
Viver por caminhos insanos.
Como fazem as pérolas,
Ao devorarem os porcos.
Pois tudo que é valor,
Se dá na aparência criada
Pelo ato de subjetivar.
Quem somos?

Do porque de mover-se...

Do porque de não conseguir mover um dedo
Surge a pergunta, que é na verdade anterior:
Qual dedo deve ser movido?
Da vontade de escapar do corpo dolorido
Vibra a alma toda num temor
Com qual arma morre o corpo já falecido?

Com o tempo que passa numa intensa lentidão
Quebra-se o pensamento que não argumenta
Mas torna-se apenas um zumbido
Que faz doer as vontades não saciadas,
os ventos não sentidos, os frios não aquecidos.

Queima forte a gélida amizade
Constituída com o não, com o niilismo
Que vai fazendo a vida, cadinho por cadinho,
Entornar um ácido no céu da boca.
Para que, a língua ardente,
não faça mais nenhum sentido.

Se, porém, quer mover-se,
Não se mova pensando.
O mundo foi feito pra estar
E nunca pra ser estando.