sábado, 29 de maio de 2010

Bilhete de despedida

Como fazer?
Estirpar-se do leito amado
sem sofrer?

Conversar por três dias?
Ou simplesmente arrumar as malas
e partir de madrugada?

Preferi sair para comprar cigarro
e deixar este bilhete
que lhe diz "ainda sou seu amado,
amando à distância; em falsete”.

-Por quê partes?
-Porque parto!
Não é falta de amor, nem cansaço de você
ou da vida que levávamos-
campo coberto de flores; madrugada fria com cobertores...
Apenas precisava; simplesmente!
entenda...

"Partir", palavra errada!
Separar-se é como sobreviver a uma doença
e ainda contê-la em sua defesa.
Trazer na alma, impressa, a marca
dos sóis nos rostos, dos campos, das ruas
dos cafés, das brigas, dos lençóis suados;
de tudo que incluiu nossa mistura.

Partir é perder um filho em acidente
e dia após dia vê-lo,
sonhá-lo grande e feito.
Partir é arrancar a faca e unha
as entranhas tuas, que agora
funcionam em meu corpo.
Partir é estar preso por uma vida,
receber, enfim, sua alforria
e perceber que seu corpo habita
uma cidade que sua mente não acompanha.

Sim, parto! Tal qual um mentiroso de cara lavada,
que tem coragem de pular um muro
sem saber o que há por detrás,
e faz-se guerreiro, sozinho e triste,
mas não enfrenta o simples de lhe perguntar-
“és feliz ou algo lhe falta?" -
por faltar-lhe coragem para ser amante.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Carpir

Enquanto a vida estoura do lado de fora
É no espelho que vejo o mundo em colapso.
Canso da minha metáfora, canso do meu “Embora”
E recomeço mais um lapso. E ainda fico perplexo!

A vida, por vezes, nem me parece vida...
Quem sabe já estou morto?
E só me resta a despedida
Quem sabe já estou morto?
E só esqueci de cair!

Não vejo futuro no brandir das espadas
Já me basta o quanto luto por mim
Já basta o meu luto

Vocação para carpideira...
Talvez seja isso!
Queixo-me todo dia à morte!

terça-feira, 25 de maio de 2010

Dentro desta lâmpada votiva habita tua vida
Alma que nos trouxe aos pés de uma realidade
Já trespassada de humilhações indignadas
Obliterada pelas conversas que propõem novas verdades.

Começaremos daqui a pouco a saber amar
Daqui a um tempo faremos um muro, por nós...
E em um instante estaremos mais que sós,
Vai ser o fim da luz da tua lâmpada.

E eu, cidadão, que não habita lugar algum
Vou voltar a buscar a sede que hoje teu vinho sacia
Talvez num porre de conhaque...

Ou talvez, bebendo de volta
o meu próprio sangue que
misturado estará à água fria...

sábado, 22 de maio de 2010

Carta à amada de um soldado entrincheirado

Eu andei na escuridão da vida.
Eu andei no contrapé do mundo.
Eu vi a lua luzindo mulher.
Vi seu amor, a luz no escuro.

Eu vi a guerra na linha de frente.
Vi os cabelos pretos da morte -
o odor pútrido - carne em decomposição;
e vi o que os urubus tramavam...

Eu pisei na estranha liga da lama:
Terra, sangue e desespero.
E apesar do medo do rifle inimigo,
Cara-a-cara, flertei com a morte.

Eu soube que amava a vida,
Quando estive de amores com a morte!

sexta-feira, 21 de maio de 2010

A Lua e Eu

De súbito a claridade! Já anunciada entre as linhas que nos perpassam
Mas que jazia escondida no que há de obscuro, no secreto do espelho.
Só o tempo, só o tempo... Que passa lento e caminha com passos firmes
Para resolidificar o sólido e expandir mais o rubro aparelho
E delatar o que seus sonhos cantam
E destruir o que temes

Ai! A solidão irá me acompanhar e não há com não ser triste
O mundo, a vida, a morte até os sonhos nos condenam à dor
Tudo que é torpe é o que existe. E tudo me parte
Cada gesto, cada cor, cada lágrima
Tudo me emociona
É um desastre!

Ai! E o que me rasga é o mesmo que me laça
É o que me faz pedir mais um gole

É o veneno que me chega em taça
É o que há de mais torpe
E o que existe com mais força

Por isso canto e clamo:
Oh lua! Oh lua!

Chegas-me com esse sorriso pleno
Essa fartura de brilho
Esse infinito nos olhos

Chegas-me com essa charla
Com o doce na ponta da língua
Com a palavra que mingua
E com o silêncio que me cala

Venha e não se afaste!
Lua minha
Sonho meu

Venha e não resguarde o sob o véu
Não me impugne teu vórtice
Que a mais pura tolice
É me privar deste céu

Oh lua! Não me impeças de teu brilho
de teu sorriso, de teu calor, de teu rosto
Pois a ti dei-me de amor
E por isso sou roto!

Poesia dedicada à Thobila de Lima Costa

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Suicidio

Meu verso não é palavra solta,
não é assim que se faz.
É carga concentrada...
Raio que corta o céu, fugaz.

Meu verso é dor de coração apertado
De amor engasgado sem poder se dar.
Explode em um momento único:
Lápis e papel, como fosse um tiro.

Meu verso é lágrima de parente próximo,
é dor que não se explica ou conforta.
Meu verso é minha morte atirada em papel.

E dos seus olhos,
lágrimas pretas,
e
s
c
o
r
r
e
m
.

domingo, 9 de maio de 2010

Comiseração

Tento hoje ver o que é a minha vida,
Porém, não sei de onde devo olhar por ela.
Todo o olhar, todo lugar, toda ferida,
Está exposta na alma como numa tela.
As verdades que sempre cultivei,
São como as farças que em meu peito colocou
O mundo, desse medo de viver e ser;
O solo em que ainda piso com temor.
Quero felicidade, amizade, amor.
Mas só percebo inveja, falsidade, pavor,
Hipocrisia em pequenas lições - para crianças -
Condescendência, desânimo, desesperança...
Queria mesmo olhar nos olhos,
Fazer a sonhada dança,
Poder ser pequeno,
Poder ser sincero,
Poder voltar à franqueza da infância

terça-feira, 4 de maio de 2010

Devaneio.

Refresco-me

Com suco de uva

Sacio-me

Na água da chuva

Afogo-me

No prazer da vulva

Transformo-me

Num vadio da vida.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Geografia de Minas

O formato de Minas,
geografia de Minas.
No triângulo, nariz:

Nariz de cão de guarda, que fareja
Investimentos, negócios e truculência...
(por baixo dos panos – pobreza)
Nariz dos moleques... que escorre.

Nariz – que corre,com pressa,empolgado,excitado,
Elétrico sobre a linha branca – que governa.
Quem governa?